quinta-feira, 15 de outubro de 2009

Um rosto de lado


A visita médica, rápida, passou por ele na recuperação. Olhar inquisitivo, pensos um pouco repassados, drenos, uma traqueotomia. A rotina. Quarenta e poucos anos de idade. O cabelo precocemente acinzentado destacando-se na almofada. As mãos estendidas ao lado do corpo. Esboçou um sorriso. Eu tinha-o visto na consulta, com a mulher. Explicara-lhe a extensão da cirurgia, a gravidade, a mutilação. A dificuldade em comunicar. O prognóstico. Aceita ser operado? Dr. claro que aceito. Eu tenho dois filhos.

Depois, na enfermaria, o lugar da cama vazio. Como um alvéolo de solidão.Um devir. Sobre a mesa de cabeceira, dois retratos. Um de quatro cabeças juntas num momento de alegria, todos abraçados. Talvez uma festa das férias passadas. Outro com o braço sobre os ombros do miúdo,decerto o filho, ao entardecer, sentados na areia da praia. Uma praia deserta. Um olhar que se alonga sobre um previsível mar ali à sua frente. Como uma grande interrogação. Talvez um sonho interrompido.

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